1. Introito.
Como lidar com a informação nos contratos, sendo ele um conceito tão vasto?
Veja que, ao longo dos anos houve o desenvolvimento da liberdade humana, para além do conceito estrito da palavra. Deste modo, a liberdade passou a vincular-se à responsabilidade por atos, omissões, e riscos decorrentes do seu exercício.
Qual a consequência? Deu origem à liberdade como a conhecemos na atualidade: sob o prisma jurídico.
Quer um exemplo? Veja o direito à transparência. Ele nada mais é do que reflexo da liberdade humana, de modo a garantir-se a informação transparente dos atos realizados no seio da sociedade.
E isso tudo, conforme determinação legal.
Novamente, voltamos a pergunta inicial: se a sua conceituação é tão complexa, como lidar com a informação nos contratos?
Ao menos nas relações contratuais entre particulares, é preciso ter em mente que há, de um lado, os contratos de consumo e, de outro, os contratos de direito civil e de direito empresarial.
Cada um detém suas especificidades, inclusive quanto à intensidade da informação.
Não obstante a informação perpasse todas as disciplinas jurídicas, traçarei, sob a perspectiva do direito consumerista e de direito civil, um breve panorama dessa questão.
2. Como lidar com a informação nos contratos de consumo?
2.1. Entendendo o direito e o dever de informação
No que diz respeito ao consumidor, a informação deve ser ampla em sentido e em abrangência.
Cuida-se de uma informação que não se limita ao contrato. Mas, sim, abrange demais situações nas quais o consumidor demonstre interesse num produto ou serviço.
Como sabido, quem conhece o produto ou serviço oferecido deverá prestar ao consumidor a informação suficiente.
Suficiente para que o consumidor tenha liberdade de escolha ou possa se prevenir quanto à eventual periculosidade ou nocividade de um produto ou serviço.
Em outras palavras: o fornecedor precisa zelar pelo cumprimento do dever de informação a todos os consumidores, os quais são alheios à realidade produto. E, por isso, são dignos do direito à informação.
Portanto, no CDC, o dever de informar não é um mero dever anexo. É um dever básico, essencial e intrínseco às relações de consumo.
Vale dizer: a escolha do consumidor somente é livre se estiver adequadamente vinculada à informação correta, acessível e satisfatória sobre produtos e serviços presentes no mercado de consumo.
E isso tudo durante todo o fluxo do contrato perante as partes envolvidas: antes, durante e após o cumprimento do objeto contratado.
2.2. O direito e dever à informação na prática.
Nessa esteira, por exemplo, decidiu a Segunda Turma do STJ que, para que a informação seja correta, clara e precisa, será necessária a integração da Lei do Glúten (lei especial) com o CDC (lei geral).
Isto porque, no fornecimento de alimentos e medicamentos a consumidores hipervulneráveis, não basta o mínimo da informação, sendo necessário sê-la o mais completa possível.
Existem, ainda, casos cada vez mais frequentes em que o problema não está apenas na informação sobre como é feito o tratamento dos dados do consumidor. Adiciona-se ao caso o que fornecedor faz com as informações coletadas do consumidor, sem autorização deste.
Chega-se, então, à novel disciplina da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei n. 13.709/2018) a qual também tem, como um de seus pilares, a autodeterminação informativa (art. 2º, inc. II).
Dessa maneira, viola o CDC o fornecedor que informa, mas não transmite efetivamente a informação.
Ora! O fato de a informação ser completa e verdadeira não afasta possíveis deficiências na forma como essa informação é transmitida ou compreendida pelo consumidor.
Em suma, a informação deverá ser tanto mais eficaz quanto mais se sabe da vulnerabilidade do consumidor.
3. Como lidar com a informação nos contratos de direito civil?
3.1. Entendendo o direito e o dever à informação
Ressalvados alguns contratos em espécie, a informação, no direito civil, não assume a mesma extensão que no direito do consumidor.
Como regra legal, amparada numa obrigação acessória, a informação pode concretizar-se como decorrência do dever de cooperação.
Isto porque, cuida-se de partes com maior capacidade de conhecimento e de previsão dos possíveis desdobramentos do contrato.
Desse modo, não há que se falar no desequilíbrio entre a parte que conhece a informação em detrimento da parte que não conhece a informação (a menos que esta tenha essencialidade).
Noutras vezes, o limite da informação reside na própria lógica do mercado, em especial quando a informação foi adquirida onerosamente. E entregá-la à contraparte pode significar prejuízo.
Ora! A informação somente deverá ser fornecida caso se mostre essencial ao contrato.
Em outras palavras: a informação não pode ser aquela obtida com significativo custo ou capaz de conferir considerável vantagem comercial à parte que irá recebê-la, sem qualquer benefício para a parte que a forneceu.
Tudo o que se afirma, porém, não significa deixar de lado a boa-fé objetiva ou de seus deveres anexos de conduta (dentre os quais está a informação), sob pena de indesejável inadimplemento.
Significa, sim, que a informação no direito civil não pode ser incompleta, falsa ou ausente a ponto de alterar a base do negócio jurídico.
Todavia, essa informação, em determinadas espécies contratuais, não precisa ser esmiuçada a ponto de inviabilizar o negócio jurídico, haja vista que as partes têm direitos e deveres em maiores condições de igualdade.
3.2. O direito e o dever à informação na prática.
Por exemplo, uma seguradora tem o dever de informar o segurado sobre as condições e cobertura do seguro oferecido.
Mas, o segurado também tem o dever de informar à seguradora sobre situações passíveis de causar (ou que já tenham efetivamente causado) risco adicional a que, se sabida de antemão pela seguradora, levaria esta a, provavelmente, aumentar o valor do prêmio ou, inclusive, a não celebrar o contrato com o segurado.
Os contratos de seguro, aliás, fornecem interessante ambiente para estudo da informação recíproca (sobretudo, do dever de informar): não só o segurado está em situação de fragilidade de informação, como também o segurador está sujeito a uma assimetria de informação capaz de comprometer a própria segurança.
4. Da Conclusão
Assim, como lidar com a informação nos contratos, você me pergunta?
Depende do caso envolvido. É relação de consumo? Contratos de direito civil? Empresarial?
Cada seara tem uma forma adequada para aplicar-se o direito e o dever à informação, de modo que se veja equilibrada as forças do contrato entre as partes envolvidas.
Nos contratos de consumo está em jogo o interesse de vulneráveis, em favor dos quais milita um forte e amplo direito à informação. Este, por outro lado, é alimentado por um acentuado dever de informar atribuído ao fornecedor.
Porém, à medida que se passa aos contratos de direito civil e empresarial, ditos mais patrimoniais, pressupõe-se outra perspectiva das relações negociais. Nestes há de se considerar a análise econômica do direito.
Mas, quer sendo os contratos de consumo, quer os de direito civil, apresenta-se o dever de lealdade, a que deve ser observado por qualquer um dos polos contratuais.
Isto é, nas palavras de Judith Martins-Costa:
“o dever de lealdade engloba o de veracidade, mas vai além, pois lealdade é mais do que veracidade: é contribuir, positivamente, com o interesse alheio e, no caso das sociedades, com o interesse comum”.
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